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Abr 26

O produtor de leite sente-se no mato sem cachorro quando resolve recorrer a um financiamento para alavancar a atividade. Ele não tem programa de crédito específico. Se quer fechar um contrato, tem duas opções: recorrer a um técnico da iniciativa privada ou pública que possa orientá-lo ou perder, por conta própria, algumas horas se enfronhando na sopa de letrinhas que são as regras de financiamento e ver, naquele emaranhado, qual linha atende às suas necessidades.

No banco, também há obstáculos. Conforme o coordenador do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural do Rio de Janeiro (Senar-RJ), Maurício Sales, o setor pressiona para que as agências bancárias, principalmente as do Banco do Brasil (BB), que é responsável por mais de 60% das contratações no País, mantenham um gerente especializado em crédito rural, “que havia, mas acabou”, diz. “O maior agenciador do crédito rural no País é o Banco do Brasil. Temos feito pressão, por meio do Sindicato Rural e de outras instituições, para ter nas agências gente que conheça de crédito rural”, diz Sales, que complementa: “Mas geralmente o produtor vai ao banco com o técnico da Emater (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural, pública) e direciona o pedido”.

O presidente da Comissão Nacional de Pecuária de Leite da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Rodrigo Alvim, pontua, ainda, que há outro problema bem específico na hora da obtenção de crédito. “Como o leite é produto perecível, o produtor não pode utilizá-lo como garantia de operação (como se faz, por exemplo, com soja e milho, onde se trocam insumos pela produção futura)”, comenta. “Assim, o acesso ao crédito com as instituições financeiras, automaticamente, é mais restrito do que para outras atividades, pois o produtor deve apresentar garantia real. Eles produzem, entregam o produto e ficam sabendo quanto vão receber pelo litro de leite 30 ou 40 dias depois”, explica o representante da CNA, sugerindo que o contrato antecipado com os laticínios daria maior previsibilidade da capacidade de pagamento do produtor às instituições financeiras, melhorando as condições de acesso ao crédito.

De todo modo, não há linha específica para as necessidades da pecuária leiteira e o produtor tem de se adaptar ao leque de opções. José Henrique da Silva, coordenador-geral de Financiamento à Produção Rural da Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário (Sead), abrigada na Casa Civil, confirma à Mundo do Leite que “não há previsão para aplicação com destinação específica à pecuária leiteira” e que no atual Plano Safra familiar, que se iniciou em 1º de julho, o total de recursos é de R$ 30 bilhões. “Pessoas físicas podem contratar linhas de crédito de custeio (para o plantio de lavouras e reforma de pasto, por exemplo) e linhas de investimento (como aquisição de tanques de expansão e ordenhadeiras mecânicas)”, explica.

Custeio – Do lado do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, que também financia o produtor rural com recursos mais robustos, de R$ 190,25 bilhões na safra 2017/2018 – embora os juros sejam mais altos, de 8,5% em média, em relação à média de 2,5% ao ano do Pronaf –, há várias linhas que podem ser absorvidas pela pecuária leiteira. O crédito de custeio, por exemplo, pode destinar-se à “limpeza e restauração de pastagens, fenação, silagem e formação de forragens periódicas de ciclo não superior a um ano, para consumo do rebanho próprio”. No caso de investimentos “fixos e semifixos” estão, entre outros itens, formação e recuperação de pastagens, reforma ou aquisição de máquinas e equipamentos e aquisição de animais para criação. “Quando se tratar de financiamento para reposição de matrizes bovinas ou bubalinas no âmbito do Programa Nacional de Controle e Erradicação da Brucelose e Tuberculose (PNCEBT), o limite de crédito é de R$ 200 mil por beneficiário e de até R$ 4.500 por animal”, informa a Pasta. Há, ainda, programas nas quais o produtor de leite pode se encaixar, como o Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor (Pronamp) e o Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica na Produção Agropecuária (Inovagro) e o Programa de Modernização da Agricultura e Conservação de Recursos Naturais (Moderagro).

Disputa – Alvim, da CNA, comenta que produtores mais tecnificados e com maior capacidade de investimentos procuram acessar o crédito rural via Moderagro ou Inovagro. “Mas mesmo assim o número de contratos e o valor contratado é bem abaixo dos setores de grãos, da bovinocultura de corte, de café e frutas”, comenta o presidente da Comissão de Leite. “Especificamente com o setor de grãos, a disputa por acesso ao crédito entre as atividades e a pecuária de leite é acirrada e, na maioria das vezes, os produtores de milho ou soja, por exemplo, são beneficiados em detrimento do produtor de leite”, informa. Sobre a “sopa de letrinhas” que são as linhas de crédito para o produtor rural, Alvim informa que a CNA está elaborando, para facilitar a vida do pecuarista, o Guia do Crédito Rural, que simplifica as informações já contidas no Manual de Crédito Rural da entidade. “O objetivo vai ser facilitar o acesso a essas informações pelo produtor”, diz.

Sales ressalta, porém, que apesar dos obstáculos burocráticos, tem melhorado o acesso ao crédito, “principalmente do pronafista”. Mas ele ressalta que a orientação principal, independentemente ou não da facilidade de fechar contratos com o banco, é que o produtor “saiba o momento certo” de obter financiamento. “Ideal é que ele tente estruturar a propriedade com recursos próprios e só então vá atrás de crédito”, diz Sales. “Se o produtor não montou uma estrutura, não fez a base do sistema e resolveu adquirir animais com crédito rural, o risco de ele não conseguir pagar aquele financiamento é grande”, continua o representante do Senar-RJ. Ele comenta, ainda, que no âmbito do Projeto Balde Cheio, que é conduzido no RJ pelo Senar, o trabalho é feito com o produtor conforme o que ele tem disponível na propriedade, sem grandes investimentos iniciais. “Quando ele vai transformar a fazenda que tem lotação de 1 animal por hectare mas já está estruturada para abrigar, por exemplo, 40 animais/ha, aí é hora de ir ao banco, em vez de usar recursos próprios”, finaliza.

*Matéria originalmente publicada na edição 87 da revista Mundo do Leite. 

Fonte: Portal DBO

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